O que cabe dentro de uma crônica? Além dos dois ou três mil
caracteres que seu espaço dentro de uma página de jornal ou revista permite, o
que mais podemos colocar dentro desse pequeno texto? Esse espaço pode ser
preenchido com alguma experiência do cotidiano, um evento corriqueiro, uma
crítica ou comentário sobre uma notícia, ato ou episódio, uma reflexão sobre o
que há na vida. Enfim, tudo cabe dentro de uma crônica, basta um assunto, a
abordagem e as palavras certas para iniciar sua escrita. E diferente do que
alguns pensam, a crônica pode viver mais que o jornal em que foi publicada, e
que no dia seguinte já é descartado, mais que uma semana ou um mês.
“Quase tudo o que cabe numa crônica está nesse livro”, diz a
orelha de Certos homens, do escritor Ivan Angelo, terceiro volume da série Arte
da crônica da Arquipélago Editorial – que já publicou nesse mesmo formato os
livros Nós passaremos em branco, de Luís Henrique Pellanda, e Esse inferno vai
acabar, de Humberto Werneck. A orelha não mente: um pouco de tudo foi utilizado
pelo autor para compor as crônicas publicadas na revista Veja São Paulo. Amor,
família, trabalho, relações inusitadas e histórias engraçadas ouvidas ou
vividas.
Há uma predileção pela nostalgia em muitos de seus textos,
que relembram épocas em que um namoro era mais difícil de ser concretizado,
quando os homens se empenhavam mais para conquistar uma mulher, o respeito e o
direito de cuidar de sua própria vida. As primeiras crônicas mostram uma
necessidade em falar das relações afetivas: o que é um beijo, o que é ter um
amor, o que é gostar de uma mulher, entendê-la e até perdê-la. O livro inicia
com o que há de mais básico dentro das crônicas e da literatura – se assim
formos considerá-la –, tratando daquilo que mais move histórias e gera
conflitos a serem resolvidos: os casos amorosos.
Falando em literatura, ela também vira tema de uma de suas
crônicas. Em “Já ouvi isso antes”, Ivan Angelo discorre sobre como um
pensamento ou frase que julgamos ser original e creditamos a determinado autor
é, na verdade, tão simples a ponto de ser repetida e recriada com o mesmo gosto
de originalidade por décadas. Não se tratam de plágios, mas a certeza de que
essa frase ou passagem de uma obra literária, musical ou qualquer outra forma
artística, surge de forma espontânea em diversos momentos da História, sem
percebermos que o significado contido nela já tenha sido sintetizado de outras
formas antes.
Há bons textos que usam a estrutura do diálogo para contar
episódios curiosos. A difícil tarefa de explicar as conveniências sociais para
uma criança que ainda desfruta de sua inocência infantil está presente em
“Conversinha sobre o pum”, um diálogo simples entre um avô e seu neto, que
termina com a criança deixando-o desconcertado frente a um assunto tão simples,
mas complexo de explicar. A mesma estrutura aparece antes em “Conversinha sobre
monstros”, um texto que mostra o medo do monstro desconhecido que habita o
quarto do menino, e termina com uma solução do avô que lhe garante coragem para
lidar com seus temores.
Política, histórias bem humoradas, vida na cidade, no campo,
no trabalho, o conflito entre gerações, tudo isso ainda pode ser visto em
Certos homens. Mas para resumir melhor, Ivan Angelo traz nessa reunião de suas
crônicas lembranças saudosas do passado que não volta, a realidade do presente
e a falta de certeza do que a vida pode vir a ser.
http://rizzenhas.com/2012/02/28/resenha-certos-homens-de-ivan-angelo/
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