terça-feira, 26 de maio de 2015

Certos homens, de Ivan Angelo



O que cabe dentro de uma crônica? Além dos dois ou três mil caracteres que seu espaço dentro de uma página de jornal ou revista permite, o que mais podemos colocar dentro desse pequeno texto? Esse espaço pode ser preenchido com alguma experiência do cotidiano, um evento corriqueiro, uma crítica ou comentário sobre uma notícia, ato ou episódio, uma reflexão sobre o que há na vida. Enfim, tudo cabe dentro de uma crônica, basta um assunto, a abordagem e as palavras certas para iniciar sua escrita. E diferente do que alguns pensam, a crônica pode viver mais que o jornal em que foi publicada, e que no dia seguinte já é descartado, mais que uma semana ou um mês.

“Quase tudo o que cabe numa crônica está nesse livro”, diz a orelha de Certos homens, do escritor Ivan Angelo, terceiro volume da série Arte da crônica da Arquipélago Editorial – que já publicou nesse mesmo formato os livros Nós passaremos em branco, de Luís Henrique Pellanda, e Esse inferno vai acabar, de Humberto Werneck. A orelha não mente: um pouco de tudo foi utilizado pelo autor para compor as crônicas publicadas na revista Veja São Paulo. Amor, família, trabalho, relações inusitadas e histórias engraçadas ouvidas ou vividas.

Há uma predileção pela nostalgia em muitos de seus textos, que relembram épocas em que um namoro era mais difícil de ser concretizado, quando os homens se empenhavam mais para conquistar uma mulher, o respeito e o direito de cuidar de sua própria vida. As primeiras crônicas mostram uma necessidade em falar das relações afetivas: o que é um beijo, o que é ter um amor, o que é gostar de uma mulher, entendê-la e até perdê-la. O livro inicia com o que há de mais básico dentro das crônicas e da literatura – se assim formos considerá-la –, tratando daquilo que mais move histórias e gera conflitos a serem resolvidos: os casos amorosos.

Falando em literatura, ela também vira tema de uma de suas crônicas. Em “Já ouvi isso antes”, Ivan Angelo discorre sobre como um pensamento ou frase que julgamos ser original e creditamos a determinado autor é, na verdade, tão simples a ponto de ser repetida e recriada com o mesmo gosto de originalidade por décadas. Não se tratam de plágios, mas a certeza de que essa frase ou passagem de uma obra literária, musical ou qualquer outra forma artística, surge de forma espontânea em diversos momentos da História, sem percebermos que o significado contido nela já tenha sido sintetizado de outras formas antes.

Há bons textos que usam a estrutura do diálogo para contar episódios curiosos. A difícil tarefa de explicar as conveniências sociais para uma criança que ainda desfruta de sua inocência infantil está presente em “Conversinha sobre o pum”, um diálogo simples entre um avô e seu neto, que termina com a criança deixando-o desconcertado frente a um assunto tão simples, mas complexo de explicar. A mesma estrutura aparece antes em “Conversinha sobre monstros”, um texto que mostra o medo do monstro desconhecido que habita o quarto do menino, e termina com uma solução do avô que lhe garante coragem para lidar com seus temores.


Política, histórias bem humoradas, vida na cidade, no campo, no trabalho, o conflito entre gerações, tudo isso ainda pode ser visto em Certos homens. Mas para resumir melhor, Ivan Angelo traz nessa reunião de suas crônicas lembranças saudosas do passado que não volta, a realidade do presente e a falta de certeza do que a vida pode vir a ser.

http://rizzenhas.com/2012/02/28/resenha-certos-homens-de-ivan-angelo/

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